A 6ª Câmara do TRT-15 negou provimento ao recurso do Município de Álvares Florence, condenado pelo Juízo da Vara do Trabalho de Votuporanga a pagar R$ 20 mil a uma funcionária pública, que também atuava como vereadora na cidade, por assédio moral, por ter sido transferida de posto de trabalho depois de uma discussão com o prefeito.
Segundo consta dos autos, a funcionária foi contratada pelo Município em 25/3/2008, no cargo de agente administrativo (posteriormente reclassificado para encarregado de seção). Além de servidora pública municipal, ela também foi eleita vereadora da cidade para o período de 2012 a 2016, em coligação de oposição ao prefeito eleito. Até novembro de 2013, ela trabalhou na secretaria de uma escola municipal localizada na região central da cidade, mas foi transferida, por ato do prefeito, para uma outra escola, localizada fora da cidade, a cerca de 15 quilômetros.
A discussão ocorreu no dia 9/11/2013, num sábado, quando o prefeito, acompanhado de um vereador, ambos de oposição ao partido político da reclamante, compareceram na Câmara Municipal, local onde se realizava o cadastramento dos munícipes como candidatos ao sorteio de casas populares da CDHU. A discussão entre o prefeito e a vereadora foi tão acirrada que esta lavrou Boletim de Ocorrência.
Logo após esse episódio, no dia 11/11/2016, terça-feira, o prefeito transferiu a reclamante de local de trabalho. Segundo ele tentou provar, a transferência teria se dado “de forma totalmente legal e devidamente motivada pelo interesse público, o que afastaria a suposta perseguição política”, e por isso “indevida a indenização por dano moral”.
Para o relator do acórdão, desembargador Fábio Allegretti Cooper, não se trata de se apurar se houve um desentendimento entre o prefeito e a autora/vereadora, ou mesmo se a sua transferência para outro posto de trabalho na semana seguinte, mas sim “se restou demonstrado se a transferência de posto de trabalho da reclamante após o desentendimento deu-se por mera vingança ou perseguição política” ou, como defende o prefeito, se a transferência se deu “em observância ao princípio da legalidade e impessoalidade no interesse público”.
Segundo a defesa do prefeito, havia um pedido da diretora de escola de ensino infantil e fundamental I, para a qual foi transferida a reclamante, que “fosse designado, com máxima urgência, um servidor para preencher o cargo de encarregado de seção na referida escola”. Esse pedido foi protocolado no dia 8/11/2013, às 15h15, e, estranhamente, despachado pelo Prefeito Municipal no mesmo dia, que o deferiu, autorizando a transferência da reclamante.
O colegiado afirmou que “é direito potestativo do empregador transferir o funcionário para qualquer dos seus diversos setores e departamentos em seu interesse, fazendo-o em atendimento aos ditames legais”, porém, ressaltou que “no caso do empregador ser a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, este deverá obedecer aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, consoante o disposto no artigo 37, da Constituição Federal”.
O acórdão registrou que há prova que na escola para a qual a reclamante foi transferida, ela “ajudava no cuidado com as crianças e que não havia na respectiva escola uma secretaria para que a recorrida desempenhasse sua função de encarregada de seção e que, evidentemente, justificasse a tal transferência”. Testemunhas também confirmaram que a funcionária/vereadora “a reclamante chegou a ficar sem fazer nada, e quando isso acontecia, a autora ficava lendo na sala onde tem uma mesa utilizada pelos professores” e que uma professora teria dito que “não era para solicitar ajuda da reclamante”.
O colegiado afirmou que apesar de a administração pública estar vinculada ao princípio da legalidade e tem o poder-dever de zelar pela sua observância, não há nos autos comprovação de que “o referido despacho exarado pelo prefeito municipal, teria sido publicado no Diário Oficial do Município ou equivalente”. Mas sim que, somente, “houve uma ordem do prefeito para transferir a reclamante a partir do dia 12/11/2013”. E não é só. “Após toda a celeuma, que culminou com a constatação do TCE que a reclamante não tinha função específica na escola e a instauração do Inquérito Civil, em 3/9/2014, para apurar ato de improbidade administrativa decorrente de irregularidades na transferência do local de trabalho, o prefeito municipal, mais uma vez, sem nenhuma explicação, transferiu a autora para o antigo posto de trabalho a partir de 23/3/2015”.
Para o colegiado, assim, “restou mais do que evidente que a transferência da autora de posto de trabalho ocorreu por questão pessoal do prefeito municipal, que sequer observou os princípios da legalidade e impessoalidade que deve estar presente em todo ato administrativo, excedendo os limites da lei e do Direito na prática do ato administrativo, passível de nulidade, quer por excesso de poder, quer por desvio de poder”.
O colegiado também concluiu que “a aludida transferência teve mesmo como único motivo o desentendimento” e que o documento que confirma a alegação do prefeito de ter atendido a um pedido da diretora da escola “não comprova, frente as demais provas produzidas nos autos, de maneira alguma, que a ordem de transferência da reclamante ocorrera em 8/11/2013, como quer fazer crer, a todo custo, o Município recorrente”. Além de tudo, ficou amplamente demonstrado que “no novo posto de trabalho não havia nenhuma necessidade urgente de prestação de serviço pela reclamante na função de encarregada de seção, que na verdade tinha por objeto secretariar a escola, tanto que a prova oral e a constatação do TCE revelaram que a recorrida ora ajudava no cuidado com as crianças e ora simplesmente permanecia ‘lendo’ na sala dos professores, sem nada fazer”.
Por tudo isso, decidiu o colegiado por negar provimento ao recurso e manter a condenação por danos morais, até porque, “a transferência da reclamante ocorreu por questão pessoal do prefeito municipal, como verdadeira ‘vindita’ pessoal e política, em total violação ao princípio da legalidade e impessoalidade”. Essa situação, segundo o colegiado, “não só causou transtornos pelo fato da autora ter que viajar para trabalhar, mas, também, conforme os atestados médicos, que a reclamante apresentava quadro grave e severo de depressão e pânico, tendo por causa que o trabalho estava piorando seu estado emocional”. Inegável, assim, que “a reclamante sofreu abalo psicológico diante da submissão ao ato administrativo abusivo”, concluiu a decisão colegiada. (Processo 0002113-47.2013.5.15.0027-RO)
Ademar Lopes Junior