O imóvel que abriga uma empresa não poderia ser penhorado devido à sua função social, dizem especialistas. No entanto, não foi esse o entendimento do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT3).
De acordo com o diretor do Instituto Mundo do Trabalho, Antonio Carlos Aguiar, o caso já seria complexo se só houvesse uma conflito de direitos fundamentais dos trabalhadores e da empresa, mas vai além disso.
“Se fosse apenas um imóvel que a empresa usa para investir, a decisão seria perfeita. Porém, é a própria sede do negócio, que tem um valor social, porque é o local onde as pessoas trabalham e os sócios tiram seu sustento”, explica o advogado.
Aguiar observa que a juíza responsável pela decisão acabou inviabilizando a atividade econômica e de geração de emprego, o que é muito grave. “Não pode haver abuso. A execução se torna forçada demais”, defende o advogado.
O processo foi movido pelos administradores da companhia, que opuseram embargos contra a penhora do imóvel. A juíza Adriana Farnesi e Silva entendeu que a constrição era constitucional, já que ao mesmo tempo em que a Constituição protege a propriedade privada, a Carta Magna também coloca o trabalho humano como fundamental.
“Não há dúvida, portanto, de que o princípio da valorização social do trabalho humano deve prevalecer sobre o da propriedade, ainda que revestida de sua função social, não sendo por acaso que o constituinte conferiu ao primeiro precedência tópica em relação à iniciativa privada no artigo 170 da Constituição Federal de 1988”, apontou a juíza.
Segundo o sócio da área trabalhista do Barbosa, Müssnich, Aragão Advogados (BMA), Luiz Marcelo Góis, a decisão foi exagerada e é um precedente perigoso para a economia brasileira. “Essa sentença pode ser atacada, porque é um precedente perigoso. Ainda cabe recurso, mas se ficar do jeito que está, é preocupante e demonstra que o trabalho para melhorar a segurança jurídica é mais importante do que nunca”, afirma o especialista.
Na avaliação do advogado, ao penhorar a sede de uma empresa, a magistrada impede a companhia de ganhar dinheiro. O efeito, na opinião de Góis, é nocivo para os próprios empregados. “É melhor preservar todos os empregos do que apenas um”, pondera.
Ele acredita que o caso poderia ser resolvido por meio do dispositivo da desconsideração da personalidade jurídica, previsto no novo Código de Processo Civil (CPC) e que permite a utilização de bens dos sócios para garantir o pagamento de uma dívida.
O acórdão mostra, entretanto, que isso chegou a ser tentado. A juíza registrou ainda que a execução foi “arrastada por vários anos” e que “inúmeras diligências” foram levadas a termo para localizar os bens dos devedores. Mas essa busca teria se mostrado infrutífera.
Possibilidade
Outra solução, para Aguiar, seria fazer uma penhora do faturamento da empresa, com bloqueio do pagamento de dividendos para os sócios. “O crédito dos trabalhos deve ser privilegiado sobre todas as outras dívidas”, complementa.
No entanto, mesmo essa solução se aplicaria somente a casos extremos, nos quais não pudesse encontrar outra maneira de garantir o pagamento do trabalhador. “Tem que ser verificado caso a caso. Essa é uma análise que é melhor realizada individualmente.”
Já Góis sustenta que apenas a sensatez dos juízes pode impedir abusos nessas situações.
Ricardo Bomfim